CELESTINO SILVA, ARTESÃO
ESPOSENDENSE, EXPÕE A SUA COLEÇÃO DE PRESÉPIOS E IGREJAS, NO CENTRO DE
INFORMAÇÃO TURÍSTICA DE ESPOSENDE
“Sou um autodidata. Um curioso que
procura mostrar um pouco do que havia antigamente na agricultura e na arte
sacra”
Celestino
Ferreira da Silva nasceu em 20 de janeiro do ano de 1947 na freguesia de Gandra,
Esposende. É casado com Maria Filomena Faria Torres e têm 3 filhos. A Elisabete,
o José e o Celestino. Reside em Curvos desde 1971, ano em que se casou. Reformado
da atividade da construção civil, onde se especializou em acabamentos,
trabalhou em Portugal mas cedo emigrou para a França. Logo que pode levou consigo
a sua esposa para a França. Em 1980 regressaram a Portugal, tendo fixado residência
na Freguesia de Curvos, onde construiu residência e ainda hoje residem. Em
Portugal estabeleceu-se por conta própria, continuado na área da construção
civil. Fazia obras para particulares e para si próprio. Em 2003 volta para
França onde esteve até 2006. Nesta data regressam “de vez” a Portugal e passa a
dedicar-se aquilo que gosta que é a realização de trabalhos em gesso. Pelo meio
ainda teve uma Café, na freguesia de Curvos, chamado “Café Cultura”, uma
novidade para a altura, trazendo um novo conceito cultural a um espaço de
restauração. Local onde a D. Filomena expôs, em permanência um valioso conjunto
de coleções pessoais que foi juntando ao longo da vida.
Dessa
exposição, que atraiu muitos curiosos e apreciadores, constam:
Coleção de
mais de cinco mil postais, de seis mil selos de Portugal, Brasil e outros
países e mais de um milhar de cartas decoradas.
Esta
entrevista acaba por contemplar uma conversa conjunta, tendo como destinatários
o Casal Celestino e Filomena Silva, uma vez que estamos perante duas pessoas
com especial carisma e dons artísticos. De referir ainda que a D. Filomena,
editor em abril deste ano uma coletânea poética intitulada «Alma de Loba».
Vamos então
conhecer um pouco melhor estes meus amigos, CELESTINO e FILOMENA. As suas
raízes, percursos, formação, gostos, a arte e as suas obras.
O ARTISTA
Celestino
Silva iniciou-se no artesanato com 15 anos de idade tendo construído logo à
data construído uma miniatura da “Capela da Senhora da Guadalupe”, com todos os
pormenores, tanto interiores como exteriores. Prestou serviço militar na Figueira
da Foz. Nessa altura nasceu mais uma importante escultura, o Hotel Ofir, onde
empregou cerca de 12 mil fósforos. Foram-se seguindo outros trabalhos em
madeira, como é o caso das 15 igrejas paroquiais do concelho de Esposende e outras
peças, como a fachada do Mosteiro da Batalha, trabalho executado em cerca de
310 horas.
Todo o seu
artesanato em madeira está conectado com a arte sacra, sendo que quase todas as
peças têm um presépio dado o seu gosto pessoal pelos mesmos, assim como o mundo
rural, com carros de bois, lagaretas, noras, moinhos. No espólio deste artesão,
pode-se ainda encontrar muitos trabalhos com inspiração no século XVII, tais
como miniaturas representando a porta do convento da Madrededeus em Lisboa, uma
prensa pombalina e pequenas peças de mobiliário. O Sr. Celestino possui uma
coleção fantástica, que nos toca pelo pormenor e pela excelência.
GOSTOS PESSOAIS
“Bem, gosto de tudo que é bom, especialmente de boa gastronomia e um bom
prato.”
DESPORTOS PREFERIDOS. CLUBE?
“Gosto e futebol. Fui jogador amador em novo. Sou benfiquista. Gosto que
vençam mas não perco muito tempo com a bola.”
HOBBYS?
“O meu hobby são os pássaros. Adoro pássaros. Tenho canários,
piriquitos e agaponis. O “Quico” trata por nome todos os da casa.” Eu testemunhei
isto mesmo, durante a entrevista, realizada precisamente numa sala onde está o
Quico.
EM QUE OCUPA OS TEMPOS LIVRES?
“Os meus tempos livres são ocupados em duas atividades
que me dão imenso prazer. Na horta e no artesanato.”
ESCRITA E LEITURA
“Para escrever nunca tive grande vontade. Gosto é de
ler. Leio de tudo um pouco, mas acima de tudo jornais, onde me tento manter
informado.”
COMO É QUE SE DEFINE A SI PRÓPRIO?
“Sou um autodidata. Um curioso, que procura mostrar um
pouco do que havia antigamente na agricultura e na arte sacra.”
DE ONDE LHE VEIO O DOM?
“Quando em novo comecei a trabalhar, naquele tempo
começava-se a trabalhar de tenra idade, ao contrário do que hoje acontece,
comecei na construção civil, que era o que havia. O que eu queria mesmo era ser
“marceneiro”, mas não consegui. Certo é que sempre gostei de mexer em madeira.”
E OS FILHOS?
“Os meus filhos são habilidosos para as artes, mas
neste momento não fazem nada nesta área. Talvez um dia comecem como eu comecei.”
FEIRAS MENSAIS DE ARTESANATO. SEI QUE
FREQUENTA VÁRIAS FEIRAS NA NOSSA REGIÃO. ESSASS FEIRAS SÃO LUCRATIVAS?
“Neste
momento participa com regularidade na Feira mensal de Artesanato que se realiza
no Largo Rodrigues Sampaio na cidade de Esposende. Também costuma participar
noutras Feiras de Artesanato que se realizam em Vila Verde, no Cais de Gaia, em
Ponte de Lima e em Amares. A estas últimas já não vou com a mesma regularidade
com que ia noutros tempos, porque torna-se um pouco cansativo e as vendas hoje
estão muito más. As pessoas, tendo dificuldades financeiras para acudir a
outros bens de primeira necessidade, não investem em arte. Nota-se que as
pessoas que apreciam e gostam, até pelos comentários que vão fazendo, mas
faltam-lhes os recursos para investir e nem sequer estamos a falar em valores
elevados. Como digo a venda é pouco significativa, por isso vou mais pelo
prazer de mostrar o que faço e pelo convívio.
"SOU ÚNICO DO MEU ESTILO NAS FEIRAS”
JÁ FOI O ARTISTA DO MÊS NA FEIRA DE
ESPOSENDE?
“Sim, já
fui. Foi no dia 28 de agosto do ano passado.”
COMO CLASSIFICA A ORGANIZAÇÃO E O
FUNCIONAMENTO DESTAS FEIRAS DE ARTESANATO?
“Gostava
que a Feira de Esposende fosse mesmo e só de artesanato em vez de muitas vezes
ser mais uma “feira de quinquilharias. Aqui há tempos presenciei à instalação
de uma banca em que a senhora foi à loja ao lado comprar umas bijuterias e logo
as colocou na banca como se fossem obra da sua própria arte. Isto é péssimo.”
O MUNICÍPIO DE ESPOSENDE TEM APOSTADO
NA CULTURA E NAS ARTES. ACHA QUE DEVE SER FEITO MAIS?
“Acho que tem havido uma boa aposta, mas que pode ser
feito muito mais.”
E O APOIO AOS ARTISTAS?
“O apoio aos artistas é praticamente inexistente. Estou
a falar do meu caso em particular, porque não conheço a realidade dos outros
artesãos. Acha lamentável que tenhamos que pagar um bilhete de 6,25€ por
presença em cada feira. Dou-lhe outro caso. Tivemos que pagar à Câmara o
guarda-sol, quando o mesmo faz publicidade à Câmara. Se o tivemos que pagar,
que pelo menos fizesse alusão ao artesão.”
NESTE MOMENTO ESTÁ COM UMA EXPOSIÇÃO
NO POSTO DE TURISMO
PODE SER VISITADA ATÉ AO DIA 10 DE
JANEIRO
“Fui convidado pelo Sr. Miguel e pela D. Aurora e
disse logo que sim, tal como dizia sempre que o Mário Fernandes me convidou a
expor na Freguesia de Curvos, na altura em foi presidente da Junta. Esta mostra
permite-me levar a um maior número de pessoas aquilo que tenho feito e o
concelho também feita a ganhar, pois vê aumentada a sua oferta cultural.”
QUAIS SÃO AS OBRAS QUE SE ENCONTRAM
EXPOSTAS?
“Essencialmente
Arte Sacra e arquitetura religiosa, construídos em barro, pedra e madeira.
Presépios, igrejas, mosteiros e basílicas. Estão expostas cerca de 50 peças,
assim distribuídas;”
35 Presépios,
a Basílica de S. Pedro, a Basílica de Fátima, o Mosteiro da Batalha, um
Oratório Presépio, um Oratório com Cristo, as 15 igrejas do concelho. Tenho lá
também uma obra muito original, que é a Basílica de Fátima com as 18 Sés dos Distritos
de Portugal continental.
QUAL É A SUA OBRA MAIS RECENTE?
“É A Estátua dos Homens do Mar de Esposende. Aquele
monumento que se encontra no Largo Rodrigues Sampaio. Também está exposta nesta
exposição”
PORQUE É QUE SE ESPECIALIZOU EM ARTE
SACRA?
“Porque como sabe, sou cristão. Sempre adorei o
Presépio. Quando comecei, todas as minhas peças tinham Presépios. Sou fã de
Presépios. As pessoas apreciam e gostam. Tenho vendido muitos Presépios para
colecionadores.”
TRABALHA POR ENCOMENDA?
“Sim. Já tenho feito muitas peças por encomenda.”
BEM, VAMOS AGORA FALAR UM POUCO DA
NOSSA TERRA. O QUE PENSA DA CIDADE E DO CONCELHO DE ESPOSENDE?
“Esposende é um concelho bom para se viver. É muito bonito.
Para mim é tudo.”
O QUE É QUE FALTA NO NOSSO CONCELHO?
“Mais apoio aos artistas e artesãos. A criação de um
espaço de artes, onde os artistas pudessem trabalhar e expor as suas obras.”
SENHOR CELESTINO, UM SONHO?
“Ter saúde.”
UM OBJETIVO?
“Ver os meus trabalhos divulgados pelo maior número de
pessoas possível e por terras distantes. Já agora aproveito para lhe dizer que
tenho recebido encomendas de várias zonas do país e até para o estrangeiro.”
O QUE É QUE AINDA LHE FALTA FAZER?
“A Igreja
da Graça em Lisboa – Panteão Nacional.”
E ENTÃO DE QUE É QUE ESTÁ À ESPERA?
“Um dia, quem sabe. O único problema é a distância.
Precisava deslocar-me lá. Se estivesse mais perto já estaria feita.”
CONSEGUE VIVER DA ARTE?
Risos… “Não! Sabe, as mulheres não querem nada em
cima do mobiliário para não ter que limpar o pó. A brincar a brincar vou
ouvindo muitas vezes isto nas conversas nas Feiras de Artesanato. Estou nisto
por puro prazer, mas claro que gostava de vender muito mais.”
ATLIER EM CURVOS
É onde
trabalha e onde recebe visitas das escolas e outras. É um local de passagem
obrigatória. Muitas ferramentas e muitos trabalhos. É aqui que o Sr. Celestino
passa muitas horas do dia e da noite.
ONDE ESTÃO À VENDA OS SEUS TRABALHOS?
“Nas feiras, nas exposições e no meu atelier, que fica
junto à minha casa, aqui na bonita e única Freguesia de Curvos.”
GOSTAVA DE UM DIA VER OS SEUS TRABALHOS NUM
MUSEU?
“Claro que sim. Tal como a maior parte das pessoas que produzem arte,
também eu gosto de a ter exposta.”
FILOMENA FARIA
Vamos agora falar um pouco da
esposa do Sr. Celestino, a “Dona Mena”.
Nasceu na Freguesia de Curvos no
dia 6 de janeiro do ano de 1951. Foi para o Brasil com 10 anos e regressou
quando tinha 18. Depois foi o que já sabemos, casou e acompanhou o marido nas
suas idas a França.
Uma colecionadora “apaixonada” que
conseguiu juntar coleções únicas compostas por milhares de peças, vindas dos
quatro cantos do mundo. Selos, postais, cartas e livros. Para além disso, uma
escritora escondida, que começou a escrever desde bem cedo, mas que talvez por
falta de oportunidade só recentemente se decidiu a publicar o seu primeiro
livro «Alma de Loba».
SOBRE QUE É QUE ESCREVE DONA MENA?
“Sempre escrevi histórias, contos, romances e poemas. Comecei a escrever
poemas quando tinha 15 anos de idade. Alguns dos meus escritos encontram-se em
duas coletâneas. Em tempos também escrevi num blogue intitulado – poetas do
solar.”
VOU DEIXAR AQUI UM DOS POEMAS DO SEU LIVRO
ALMA DE LOBA
BRINCANDO COM AS PALAVRAS
Quando saíres desse teu mundo,
Sofisticado e incoerente…
Vem visitar o meu, que é bem mais
banal!
Indefinido, inexplicável,
incompreendido,
Sem arte nem sentido, sem bem nem
mal…
Tudo se resume às letras,
Que vou juntando para formar
palavras.
Digo o que quero, sem medos nem
fingimentos,
Digo o que penso?
Retalho as palavras, desfaço-as…
Invento-as!
As verdades mais duras,
O sofrimento mais intenso,
Tudo eu posso, nas palavras que
escrevo.
Digo quem sou, tal como me conheço,
E a quem me conhecem
Que me amem ou não…
Não balanço na corda,
Nem que me fustigue o vento,
Das amizades que não quero,
Nem aceito.
As possíveis indiferenças…
Não as quero para mim,
Nem aos outros as ofereço.
A indiferença mata,
Até os mais fortes sentimentos.
Sou como as folhas das árvores,
Ou como as raízes, presas no chão.
Definam-me como quiserem,
Porque importância, não dou!
Em dias sou mulher,
Em outros, apenas um ser.
Dou simples sorrisos ou grandes
gargalhadas!
Mas também tempero a vida,
Com minhas lágrimas salgadas…
E dentro deste meu corpo,
Carrego tempestades,
Sou imprevisível como o tempo…
Comigo, ninguém tem certeza de
nada.
Sou fúria, sou vento…
Raios que cortam o céu,
O estrondo da trovoada…
Mas também sou uma doce criatura,
Meiga, carinhosa, apaixonada.
Escrevo poemas, mas não digo nada.
Conto uma história, verdadeira ou
inventada…
Falo de tudo e de nada…
Só pelo gosto das letras,
Que vou juntando,
Para formar palavras.
[Mena Faria]
NOTA FINAL
Conheço o
meu caro amigo, Celestino Ferreira, a sua esposa Mena Faria e os demais
familiares, há mais de 25 anos. Pessoas sempre abertas à modernidade e muitos
sensíveis a temas como a arte, a escrita e a cultura no seu todo.
O Sr.
Celestino expôs, a meu convite por várias vezes nas instalações da sede da
Junta de Freguesia de Curvos e sempre fez questão de participar nas inúmeras
atividades culturais que promovi. Participou em workshops e sempre me recebeu
no seu atelier com toda a simpatia e bem receber.
A D. Mena participou num concurso
de escrita que contou com inúmeros trabalhos de escritores de referência, tendo
sido premiada pela qualidade e originalidade da sua escrita. Histórias e contos
a retratar, em muitos casos, a sua própria vivência e o seu percurso de vida. Fui
júri nesse concurso e gostei de conhecer a sua obra. Recomendo a leitura do seu
livro de poesia «Alma de Lobo» porque aí se encontram poemas de uma enorme
sabedoria e originalidade.
Muto obrigado pela forma como mais
uma vez me receberam um sua casa e pela sempre pronta resposta a todas as
questões que lhes coloquei. Foi um prazer realizar esta entrevista e com ela
dar a conhecer um artesão de excelência e uma colecionadora e escritora de
grande valor. Duas personalidades curvenses que engrandecem a arte e a cultura
do nosso concelho e levam longe o nome de Esposende.
FELIZ NATAL
Desejo um Santo Natal e
festas felizes a todos os leitores, amigas e amigos. Sendo este um período de
especial celebração natalícia, importa que tenhamos uma atenção redobrada a
todos quantos sofrem e àqueles que passam por dificuldades. Que a solidariedade
esteja presente com mais força do que nunca, tanto nas nossas palavras como e
sobretudo nos nossos atos e ações.
Um abraço.
Mário Fernandes
18-12-2015
1 comentário:
O Sr. Tino e a Meninha são dois grandes artistas!
Parabéns aos dois e muito sucesso!
Alice
Enviar um comentário